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Musical revive época em que negros e judeus davam o tom cultural na carioca Praça 11

Um musical documentário. Assim pode ser definida a peça “Negros e Judeus na Praça Onze”,

que estreia no próximo dia 3, às 21h, no Teatro Vannucci, na Gávea, no Rio de Janeiro. Em cena, duas épocas: o presente e o passado de duas pessoas que chegaram à Praça Onze nos anos 1930. Décadas depois, se reencontram e relembram o passado comum no bairro.

É musical porque o texto, adaptado do livro “Negros e Judeus na Praça Onze. A história que não ficou na memória”, da jornalista e escritora, Beatriz Coelho Silva, é “costurado” por 18 músicas: 15 brasileiras e três judaicas. É documentário porque todo o livro se baseia em testemunhos de personagens reais. Além disso, as músicas que compõem a peça são da época (primeira metade do século XX) e retratam o cotidiano do bairro.

A Praça Onze, cujo nome original era Praça 11 de Junho, existiu por mais de 150 anos até a década de 40 e chegou a ser o bairro mais cosmopolita do Rio de Janeiro. Era naquela região que os imigrantes que chegavam, na então Capital Federal do Brasil, se instalavam. Os negros, em geral oriundos da Bahia, e judeus, de várias procedências, eram maioria. A Praça Onze foi quase toda demolida, em 1942, para dar passagem à Avenida Presidente Vargas.

Para marcar as diferenças de tempo, o diretor Renato Penco usou vários recursos. O momento presente tem uma cenografia atemporal, com “cores reais”. O passado vem ao palco em tons de sépia, reforçados por jogos de luz. Em cena, os dois personagens principais são interpretados por quatro atores. A negra mineira Maria do Socorro, no presente, é vivida por Renata Tenório; no passado, é Maju Tatagiba que, com 14 anos, é a mais jovem integrante do elenco. O judeu polonês Josef Lewbosckvist quando jovem é feito por Hugo Barrylarri; na velhice, por Gerson Rodrigues - que também está em cartaz, na comédia “A Demitida”, no Teatro Princesa Isabel, em Copacabana, mas essa é outra história.

“Acredito que a principal solução cênica a que cheguei foi a utilização do coro. Dessa forma, equalizo as vozes dos atores e, ao cantarem em grupo, dão mais força para as músicas”, conta Penco, ganhador do Prêmio Shell de inovação 2017 pelo seu trabalho à frente da Rede Baixada Em Cena, que reúne 18 coletivos da Baixada Fluminense.

O diretor destaca ainda a importância de dois personagens: Juvenal (Wendel Mendes) e Jacarandá (Alexandre Araújo). O primeiro, segundo Penco, é o tipo que deu origem ao “malandro carioca”. O segundo, “reza a lenda”, foi quem inspirou os estúdios Disney a criar o Zé Carioca. Na vida real, Jacarandá foi um advogado negro, que se vestia “com a mesma beca dos brancos” e usava calçados – algo raro para um negro naquela época.

A peça tem como diretor musical o arranjador, produtor musical e violonista Paulão 7 Cordas (em janeiro, este blog fez uma matéria com o músico quando ele assumiu esse desafio inédito em sua carreira, iniciada aos 17 anos de idade). Ele gravou a base das músicas que fazem parte do espetáculo de maneira a serem tocadas e cantadas da forma mais próxima do original, com os arranjos característicos da época. São sambas de Herivelto Martins, Assis Valente, Pixinguinha, João da Baiana e Noel Rosa, entre outros. Na época do desmanche da Praça Onze, o samba e o choro se firmavam comercialmente e o carnaval tomava sua face atual, com a criação das escolas de samba. Hoje, o Sambódromo está erguido no pouco que sobrou do bairro original.

Foi a surpresa de saber que duas culturas tão diferentes conviveram de um modo muito harmonioso no passado do Rio de Janeiro que despertou em Beatriz a vontade de contar essa história. E a informação lhe chegou em meio à apuração de uma reportagem. Na época, ela trabalhava como repórter de Cultura, na sucursal carioca do jornal O Estado de S. Paulo. Primeiro, ela transformou o tema na sua tese do curso de pós-graduação em História do Brasil na Universidade Federal Fluminense (UFF). Depois, escreveu o livro, lançado no final de 2015. Pensou em adaptá-lo para o cinema, mas esbarrou na dificuldade de levantar a produção. Acabou por levar a história para o palco, em formato de musical.

“Existem mais de 50 músicas sobre a Praça Onze, que nos permitem conhecer muito da história do Brasil. Para fazer a adaptação, escolhi as músicas e fui contando a história de acordo com elas”, afirma Beatriz, mais conhecida como Totó.

Ela conta que, apesar das culturas judaica e negra serem diferentes, naquele época, comungavam de vários pontos em comum: não eram povos católicos; não eram benquistos de um modo geral pela sociedade; tinham uma culinária totalmente diferente da portuguesa, que então dominava culturalmente a cidade; as mulheres tinham mais protagonismo entre eles; eram pobres; gostavam de festa e não podiam voltar para suas terras de origem.

“Os judeus não podiam voltar porque seriam mortos e os negros porque não sabiam de onde eram originários”, observa Totó.

Serviço

Negros e Judeus na Praça Onze, o musical

Teatro Vannucci – Shopping da Gávea – Rua Marquês de São Vicente, 52 3º piso

Telefone: 55 21 2274-9895

Dias: Segundas (3, 10 e 17 de abril) às 21 horas

Terças (4, 11 e 18 de abril) às 19 horas

Ingressos: R$ 60,00 (inteira)

R$ 30,00 (meia)

Ficha técnica

Beatriz Coelho Silva (Totó) – autora

Paulão 7 Cordas – diretor musical

Renato Penco – diretor geral

Ivan Machado e Chico Donadoni – preparadores vocais

Rayssa de Castro Lima – produtora artística

Fernando Reski – consultor de cultura judaica

Elenco (por ordem de entrada)

Gerson Rodrigues

Renata Tenório

Hugo Barrylarri

Anderson Ribe

Alexandre Araújo

Maju Tatagiba

Desirré Holz

Rayssa de Castro Lima

Wendel Mendes Para comentar, aqui

Ouça aqui duas versões de músicas que fazem parte da peça:

Cansado de sambar, de Assis Valente, com o Bando da Lua

Quando a polícia souber, de João da Baiana, com Clementina de Jesus e Cristina Buarque

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