Há cerca de 40 anos, o restaurante Steak House é referência, em Icaraí, Zona Sul de Niterói.
Por ser um dos raros a ficar aberto de madrugada, se tornou reduto dos boêmios da cidade. Durante o dia, os fartos pratos à base de carne garantiam o sucesso do estabelecimento. Na última sexta-feira, a movimentação rotineira da manhã não permitia prever o caos que se abateria no local, no melhor estilo “apertem os cintos, o dono sumiu”. Literalmente.
Elton Furrier, o dono, abriu normalmente o estabelecimento e avisou que iria fazer compras. E desapareceu. O gerente Milton também sumiu. Julio Cesar Mello, funcionário da casa há 23 anos, resolveu agir. No sábado, convocou os colegas e perguntou quem toparia assumir o controle do local. Dos 70 funcionários, 40 aceitaram o desafio. Formaram uma cooperativa e arregaçaram as mangas.
“Há dois anos, a situação do restaurante é ruim. Era comum nós comprarmos a mercadoria e o Elton nos pagar depois. Ele sempre foi um ótimo patrão. Era um cara de bom coração. Ele sempre pagou em dia, mas, ano passado, começou a atrasar os salários. Sabíamos da crise, mas ele nunca reuniu a equipe para uma conversa. Essa é nossa mágoa”, conta Mello que trabalhava como caixa e assumiu a função de gerente.
Segundo ele, o movimento do Steak, na madrugada, caiu 70% nos últimos anos, “por conta da violência da cidade”. O restaurante, que ficava aberto até as 5h, passou a fechar, no máximo, às 2h. De dia, a frequência também “caiu bastante”. Nesse caso, Mello acha que a culpa é “da crise”.
Some-se a isso três grandes obras de estrutura que o Steak teve que passar. Há dois anos, a cozinha pegou fogo. Para fazer as reformas, o dono pediu empréstimos bancários. Há pouco tempo, a água foi cortada por falta de pagamento e o restaurante funcionava com abastecimento de caminhões-pipa. Segundo Mello, o gás pode ser cortado a qualquer momento. Ele não tem ideia se a conta de luz está paga ou atrasada. O aluguel do imóvel está com contrato vencido. Ele não soube informar os valores, mas o que “corre à boca pequena” é que os donos estariam pedindo R$ 70 mil de luvas para renová-lo e que o aluguel seria de mais R$ 30 mil.
Quando as portas do Steak House se abriram, no sábado, os moradores de Niterói foram, ao longo do dia, checar o que, afinal, estava acontecendo com o lugar. A notícia de que os funcionários tinham assumido o controle do restaurante se espalhou rapidamente. Antigos clientes chegaram trazendo mercadorias – somente um deles levou peças de filé mignon que garantiram o funcionamento do dia. Clientes que há tempos não frequentavam mais o lugar, voltaram. Mello e equipe não tiveram um minuto de descanso.
“O movimento dos moradores está dando força para a gente. Da noite para o dia, perdemos tudo. Não temos notícias do Elton. De repente, ninguém mais sabe dele. Vai ver, está com vergonha”, comenta Mello.
Ele e os colegas agiram por impulso e não têm ideia por quanto tempo conseguirão ou poderão manter o restaurante em funcionamento. Clientes também se comprometeram a ajudá-los com as questões burocráticas da situação. Um deles já teria começado a negociar a renovação do aluguel.
Somente no domingo, Mello foi quatro vezes ao mercado. As compras eram feitas conforme a verba entrava. Ao longo do dia, a casa lotou. No final da tarde, o chope acabou e novos barris foram providenciados. No início da noite, o movimento indicava que haveria bastante trabalho pela frente, como há tempos não acontecia.
“Nada disso é nosso, não sabemos como fazer, mas vamos ficar, queremos ficar. Vamos ocupar o Steak e trabalhar porque trabalhar é mole. A dívida que já existe é que é o problema. Como podemos salvar a casa se ela não é nossa? Estamos vivendo no limite. Estou esgotado. Na verdade, tudo isso até parece uma novela”, afirma Mello.
Veja aqui, em breve, informações sobre os próximos capítulos.
Maradora, ou Antônio Pires de Freitas, que trabalha no Steak House há 34 anos, em ação no início da noite de domingo.
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